Agência de modelos com deficiência confrontam ditadura da perfeição


Mistura Urbana
01/07/2013

Hoje com a diversidade no auge e as marcas entrando no ritmo do “adapte-se ou morra”, agências especializadas em modelos com alguma deficiência propõe inclusão no mercado da moda, de um público representado por mais de 46 milhões de consumidores.

da Redação
A agência americana Doll Parts da Tarah Una e a agência da fotógrafa brasileira Kica de Castro, a primeira no país nesse segmento, se destacam nessa proposta. Ambas possuem interesses acima do lucro: promover mensagens de superação, liberdade, respeito e evolução social.
uma modelo, com estilo de motoqueira, tatuada e o braço amputado, agachada ao lado de uma moto
Foto da agência Doll Parts da Tarah Una

Kica de Castro trocou o mercado publicitário para assumir o setor de fotografia num Centro de Reabilitação para deficientes. Incomoda com o constrangimento dos pacientes diante da câmera, foi a 25 de Março e comprou acessórios e itens de beleza e simulou um estúdio de moda dentro do seu departamento. Essa iniciativa deu espaço para um projeto de fototerapia, focado no resgate da autoestima dos pacientes.
Em 2009 lançou a agência de modelos para pessoas com alguma deficiência e somente após conseguir parceria com a agência alemã Visible teve mais abertura no Brasil. Desde então alcançou grandes avanços na inclusão de modelos deficientes no mercado brasileiro. Hoje sua agência conta com 80 modelos.
Conversamos com a Kica, e ela nos contou um pouco sobre o cenário atual do mercado, os trabalhos que tem feito e as expectativas para o futuro. Confere ae!
uma modelo deitada com a sua cadeira de rodas na beira do mar
Foto de Kica de Castro

Você ainda tem parcerias com agências fora do país como a Visible na Alemanha?
Kica.: A parceria com a Visible acabou em 2010, quando eles deixaram de cumprir o contrato. Hoje tenho vários contatos com empresas fora do Brasil que contratam modelos com deficiência, principalmente modelos fotográficos, voltados para aparelhos ortopédicos.
-Fale um pouco sobre os trabalhos que as suas modelos já fizeram fora do Brasil.
Kica.: Recentemente fizemos uma campanha para uma griffe Italiana, para acabar com o preconceito no mundo da moda. As fotos foram feitas no Rio de Janeiro e divulgadas lá fora. As empresas, por uma questão de custo, preferem que as fotos sejam feitas aqui, pois, eles também preferem que seja o meu olhar inclusivo para campanha.
-Como está o mercado da moda hoje para modelos deficientes no Brasil?
Kica.: A moda vem abrindo espaço a cada dia. Primeiro foram os editoriais, em seguida as passarelas e hoje faculdades de moda colocam a moda inclusiva como grade curricular, fazer roupas adaptadas de acordo com a necessidade de cada deficiência. As empresas ainda não colocam a disposição para o consumo direto. O que existe são estilistas que fazem por encomenda. Vale a pena ressaltar que estamos falando de 46 milhões de consumidores com alguma deficiência, que gostam de estar bem vestidos.
-O mercado está mais inclusivo do que quando iniciou a agência?
Kica.: Os atuais resultados são bem mais positivos do que no começo. Mas ainda existe muito trabalho para ser feito, para que esse mercado venha a ser considerado inclusivo de fato. Muitos desfiles deixam de contratar esses profissionais, por puro preconceito. Além de faltar acessibilidade em vários estabelecimentos. Esses profissionais são qualificados para o trabalho e ter eles nas passarelas não é questão de “modismo”, as oportunidades precisam existir de igual para igual.
-Fale um pouco sobre os clientes que a sua agência tem hoje.
Kica.:
- Mercadinho Chic, para ação de promoção no SPFW;
- Fiat, para apresentação dos produtos em uma feira voltada para o publico com deficiência;
- Estilista Cândida Cirino, do Paraná, que esta investindo na moda inclusiva e contrata os modelos para desfiles e editoriais;
- Fator Brasil, confecção de roupas para pessoas com nanismo. Que contrata os modelos para catalogo da marca;
- Agencia de animação Tchaka Eventos, para festa em geral. A Drag Queen Tchaka e considerada a rainha das festas em São Paulo;
- Produtora Norma Desmond, do diretor Murillo Flores, para artes cênicas.
Três modelos. A do meio é cadeirante e as outras estão ao seu lado, apoiando na cadeira.
Foto de Kika de Castro

-Como os modelos com deficiência chegam até você?
Kica.: Alguns por indicações de amigos e até mesmo do casting, outros por fazerem pesquisa na internet: redes sociais, links. E alguns pelo caça-talento, quando eu estou em busca de novos modelos para compor o casting.
-Quais são os fatores que você avalia antes de agenciar um(a) modelo?
Kica.: Por ser um mercado de trabalho rígido, as regras não são tão diferentes do mercado convencional. O modelo não pode ser tímido, tem que seguir regras, chegar no horário, ter atividade física, cuidar da aparência, ter disciplina com alimentação, estudos. Muitas pessoas acham que ser modelo não requer estudos, isso é um erro. Regras básicas de etiquetas são cobradas a todo o momento, principalmente pelo cliente. A expressão corporal, também é avaliada a todo o momento, não apenas na hora de executar o trabalho, mas na seleção também. A forma como esta sentado, como toca a cadeira, como pega na muleta, bengala … O corpo fala, então chegar de cabeça baixa, ou achando que não vai conseguir uma oportunidade são as primeiras barreiras que devem ser superadas. Bom ressaltar para os futuros candidatos que as oportunidades surgem, mediante ao esforço e dedicação de cada um. Nada caí do céu e o trabalho é em equipe.
-Você tira fotos bastante ousadas e nunca tenta esconder ou disfarçar a deficiência. Como você trabalha com o modelo para ele se sentir a vontade com a ideia de explorar o próprio corpo na frente da câmera?
Kica.: No mundo em que vivemos não existe a perfeição. A mídia a todo momento tenta criar um ser humano referencia de beleza, que não existe. O que esta estampado nas capas de revistas são imagens retocadas por computação gráfica, que muitas vezes, deixa a pessoa diferente do que ela é. È normal fazer pesquisa da internet e ver exemplos de retoques que não deram muito certo. A pessoa precisa aceitar como ela é, antes de mais nada. A felicidade é a melhor maquiagem que pode ter dentro de um estúdio fotográfico. Se uma modelo pode fazer caras e bocas em uma cadeira, essa pode ser uma cadeira de rodas. Se a pessoa precisa do aparelho ortopédico para locomoção, na foto ele pode ser um acessório de moda. Tudo é uma questão de ponto de vista. Antes de fazer arte com fotografia, o que permite criar muitas coisas, eu estou trabalhando com pessoas e preciso mostrar como elas são, sem mascaras, sem manipulação de imagem, sem esconder nada. Preciso primeiro mostrar o ser humano que existe ali na minha frente e depois dar asa a minha imaginação.

-Você foi a primeira a abrir uma agência nesse âmbito no Brasil. Ao mesmo tempo que propõe inclusão para o mercado, você também confronta uma sociedade que só aceita ser impactada por uma marca se ela pregar a perfeição. Como cidadã e profissional, o que você espera alcançar com o seu trabalho?
Kica.: Como objetivo, temos a intenção de acabar com o preconceito e fazer a inserção desses profissionais no mercado de trabalho de forma natural, valorizando o potencial que cada um têm.

“Acredite em você e não deixe ninguém tirar o seu foco. Confie em Deus, haja com honestidade e siga o seu caminho” - Kica de Castro
um trabalho e tanto

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