Mulheres e suas historias

Especial: Eulália Pinheiro

sexta, 16 de novembro de 2012 • 13:34
 
 
Mulheres: Eulália Maria Pinheiro
Em uma dessas noites de muito calor e nostalgia, resolvi passear pelas livrarias da cidade. Tenho uma estranha mania: ao escolher os meus livros, abro em qualquer página e leio. Se gostar do que li, pronto! O autor ganha a minha dedicação. Eduardo Galeano ganhou!



(Eliana Calmon,Ellen Johnson-Sirleaf,Aung san suu kyi )"(...) um dia os homens mataram todas as mulheres e puseram as máscaras que as mulheres tinham inventado para aterrorizá-los. Somente as meninas recém-nascidas se salvaram do extermínio. Enquanto elas cresciam, os assassinos lhes diziam e repetiam que servir aos homens era seu destino. Elas acreditaram. Também acreditaram suas filhas e as filhas de suas filhas (...)” Eduardo Galeano.

Ao abrir aleatoriamente seu livro intitulado “Mulheres”, surpreendi-me com um texto chamado “Autoridade”, mas o livro fala de todos os tipos de mulheres. Exalta as mulheres, a existência delas e “critica” as opressões sofridas tempos atrás.

Opressões Sofridas? Passado? Hein? Eu sei que: “Quando o Talibã assumiu o poder em Cabul em Setembro de 1996, 16 decretos foram transmitidos pela Rádio Sharia. Entre estes darei destaque para os que envolvem as condições das mulheres: É proibido às mulheres andar descobertas. É proibido lavar roupa à margem dos rios. É proibido a alfaiates costurar roupas femininas ou tirar medidas das mulheres. Caso sejam encontradas revistas de moda na loja, o alfaiate será preso. Se andarem com roupas da moda, ornamentadas, apertadas e atraentes para se exibir, serão condenadas pela Sharia Islã e perderão a esperança de um dia chegar ao Paraíso.” Pena que não disseram que Paraíso era ou é esse. E o pior, parece-me que essa ditadura ainda existe, apesar de informarem na mídia que não. (Hum, sei!).

Violência contra Mulher é crime.Maria da Penha.Brasil.Ufa!
Mulher ser inferior, ilógico. Eu tenho uma teoria: a mulher é a evolução do homem! E isso não é mentira! Acreditem, afirmo que isso é verdade. Darwin, como homem, sabia disso, porém não quis relatar para não desapontar os “Companheiros Machistas”. Estou relatando agora, só para vocês, tá?! A mulher é a evolução! (Ah! E têm outras coisas sobre a supremacia da mulher. Não posso falar por motivos de segurança pessoal. Vou me silenciar, caso contrário, serei apedrejada por homens xiitas na porta do meu prédio. Sério!!! Isso existe!)

Pois bem, terminei de ler o livro no meio da noite. Pensei na manhã seguinte: Opa! Meu estado tem uma mulher Presidente do Tribunal que marco bonito. Preciso conversar com ela. Quero saber de todos os passos para chegar a Presidência. Cá prá nós, ser Presidente de um Tribunal requer no mínimo coragem.

Que mulher é essa? Preciso conhecê-la, pensei. Será muito bom falar com a Desembargadora Eulália Pinheiro. Como Deus me deu um temperamento insuportável no que se refere a conseguir algo que a olho nu parece impossível, só descansei quando a assessora de imprensa, Virginia, uma jornalista extremamente responsável – mulher -, marcou prontamente um encontro às oito da manha de uma quarta-feira.



(Ingrid Betancourt,Madre Teresa de Calcutá,Michele Obama)Na quarta-feira eu estava ansiosa. Queria muito conhecer a Desembargadora. Acordei às seis, tomei um copo de leite e saí. Ao chegar ao Tribunal estacionei o carro. Eis que um ilustre desconhecido - flanelinha - me dá uma lição de moral (ou imoral?!). Disse: "Qual éééé?".

Eu estava tão entretida com meus pensamentos que não falei nada. Mas o “dono da rua” falou de novo: “Qual é, tia? A senhora não tem vergonha de andar com um carro tão sujo desse? Se eu fosse bacana teria muita vergonha”.

Parei. Olhei. Pensei no que ele me falou e irritada disse: “Você está me desconcentrando, cale a boca!”.

E ele, insistentemente, foi me seguindo e falando: “Tia, deixa eu lavar o seu carro. Tia, deixa eu lavar seu carro." E repetia incansavelmente. Parecia um mantra. E completou a sua fala: “Tia, a senhora vai ser barrada por andar dentro do carro do lixo, parece até uma mendiga.” Parei. E de novo o olhei. E pensei: que ignorância dele. Ou a minha?
Lembrei da música do Gilberto Gil e cantei para ele:

Essa aparência de um mero vagabundo é mera coincidência/ Deve-se ao fato de eu ter vindo ao seu mundo com a incumbência/ De andar a terra, saber por que o amor, saber porque a guerra/ Olhar a cara da pessoa comum e da pessoa rara/ Um dia rico, um dia pobre, um dia no poder/ Um dia chanceler, um dia sem comer/ Coincidiu de hoje ser meu dia de mendigo.”
Ele ficou atônito e sorriu. Eu disse: “Você venceu, meu chapa! Pode lavar o carro. Quem sabe assim terei mais caráter e ética. Mas vamos fazer um acordo? Te pago o dobro se você esquecer esse papo de tia. Tudo, menos tia. Ando meio complexada. E outra, você é muito idoso para eu ser sua tia.”

Ele disse: “Já é! Pode deixar, vou deixar o caranga nos trinques, ti....a.... Tia não! Doutora. Acertei! Sou bom nisso, aprendo rápido."
Rimos juntos daquela situação sem pé e nem cabeça.

Mas :“a vida, é assim.A vida é assim. Vida humana. Vida é alegria. Vida é cor e confusão. Vida é som e paixão”...

Cheguei na hora marcada e encontrei três pessoas educadíssimas na recepção da presidência do Tribunal: Aldemar, Idelbam e Jurema. Um deles me informou para eu esperar a jornalista e assessora Virgínia Fabris.

A jornalista chegou minutos depois. Cumprimentou-me, juntamente com o jornalista Fernando Castelo Branco, ambos assessores de impressa do Tribunal. Um time de primeira!

Ficamos esperando a Desembargadora chegar. Recordo-me que apareceu o Antônio, o senhor que serve o cafezinho, e com os dentes da simpatia e da felicidade verdadeira ofereceu-me um café e eu disse: “Sim, por favor, um pouco de café, com uma colher de açúcar e dois pingos de adoçante.” E completei: “Não precisa entender minha bipolaridade do café, é um costume para não engordar”. Antônio, o homem simples do cafezinho, sorriu.

A jornalista Virginia entrou na sala da desembargadora e quando retornou, afirmou: “A desembargadora irá falar com você.” Eu agradeci.

Ela comentou com outra pessoa, que não me recordo o nome: “Como a sala da Desembargadora tem um cheiro bom!” E perguntou o que era. A pessoa disse: “Eu acho que é o perfume da Desembargadora.” Permaneci calada e curiosa. A melhor das sensações dos sentidos. Cheiro. Queria sentir o cheiro.

“Pronto, pode entrar”, disse a jornalista.Entramos.

Quando entrei, senti o cheiro de flores e vi uma mulher de estatura mediana e muito dinâmica. Era a Desembargadora Eulália. Uma mulher ágil, com uma voz grave e raciocínio rápido. Sentei ao seu lado, agradeci e disse que queria conversar sobre o judiciário. Ela respondeu: “Então vamos!”

Com a palavra: A Dama das Flores, A Dama da Voz, A Dama da Justiça:



Desembargadora, a senhora é a primeira presidenta a ser nomeada nesse tribunal do Piauí? O que significa isso para senhora?

– Sim. É uma missão. Eu fui a primeira juíza aqui do Piauí, ingressei no ano de 1978. Quando chegou a minha oportunidade de concorrer à presidência do tribunal, eu concorri. E fui aclamada, na época.

O que isso significa, tendo em vista que o Mato Grosso e o Piauí foram considerados tribunais não muito bons pelo CNJ?

– Muita responsabilidade e muita preocupação em agir com destreza. Porque a nossa finalidade é ajudar, mas também com muita responsabilidade. Essa sua colocação, de terem sido o Mato Grosso e o Piauí considerados os piores do Brasil, decorre das dificuldades do tamanho do território. Fui agora ao encontro em Macapá e vi um tribunal pequeno, com poucas comarcas e com tudo digitalizado. Aqui temos comarca de distância de mais de 1000 km. Difícil digitalizar tudo. Até as operadoras de telefonia dificultam um pouco esse trabalho. Mas temos vontade e empenho, não é desídia nossa. Todo mundo está empenhado em resolver os problemas. Fico até triste, porque o ideal seria que fôssemos os melhores e lutamos para isso.



E o futuro do Judiciário do Piauí?

– Primeiro, melhorar a prestação jurisdicional como um todo, que a finalidade do poder judiciário é o que traz a paz social. Segundo, para eu conseguir uma prestação e posicionar o melhor, eu tenho que: ter uma quantidade necessária de servidores, ter pessoal qualificado e melhorar os fóruns. Tenho essa prioridade, que seria construir fóruns nas comarcas maiores. Inclusive nelas eu trabalhei e como corregedora vi que eles já estão insuficientes para o tamanho do movimento.

No seu trabalho na corregedoria, a senhora viu a real situação do poder judiciário no Estado?

– Eu visitei quase todas as comarcas. Eu só não fui pessoalmente à região sul, mas na região norte eu fui em todos e existe deficiência. O gestor do local é o juiz do fórum. Ele tem mil atribuições, principalmente em uma comarca pequena... Ele é juiz federal, do trabalho, de casamento. Inclusive juiz criminal e cível. Então, ás vezes, fica um pouco difícil a gestão. E para melhorar, tem que ter dinheiro, o dinheiro depende de orçamento e tem que seguir os padrões da lei. Essa dificuldade eu senti, procurei melhorar. Mas tenho certeza que com o Corregedor atual, Des. Paes Landim, e comigo na presidência, que conhecemos os problemas, a tendência é melhorar.



Em relação aos fóruns da capital, especificamente o de família e cível, a senhora tem alguma solução?

– Estamos terminando uma obra que será entregue em dezembro. Eu disse para eles que o aditivo é até 150 dias. Não quero prorrogar. Assim vai melhorar tudo. Vamos ter condições de dar o melhor local para as pessoas trabalharem e as partes procurarem a justiça.

Como é a sua relação com os outros desembargadores?

– Graças a Deus, o meu relacionamento com os desembargadores é muito bom, nenhuma aresta. O que levo para o plenário sempre vai aprovado. Lógico que não é nenhuma unanimidade que você combina. É uma unanimidade normal, de acordo com o voto de cada um, mas com todo respeito e tudo tranquilo e não tem problema nenhum.

A Senhora acha que a sua gestão vai ficar para história?

– Eu pelo menos quero cumprir com o meu dever, pois acredito que deva ficar para história. Mas eu quero que seja uma história bonita, composta de trabalho e de respeito. O tribunal deve ser respeitado. O que mais importa no mundo é uma justiça respeitada. Um poder judiciário desrespeitado não tem vida.



Como é sua vida? O seu tempo ?

– A minha mãe dizia que nós fazemos o nosso tempo. Faço o meu tempo. Eu tenho tempo de ser magistrada, tenho tempo para ser gestora, tenho tempo de ser dona de casa, mãe, esposa e às vezes ainda sobra uma folga para passear. E agora, avó. Os meus netinhos... E estou esperando mais duas.

A senhora recebe todas as pessoas? Os movimentos sociais e os menos favorecidos?

– Tenho recebido todos, depois que assumi o cargo. Todos que marcam e que dá tempo, eu atendo.

Não é um tribunal fechado para Elites?

– Não, de maneira alguma. Inclusive quando é alguma coisa que a gente tem que fazer uma provocação para agilizar, se faz.

Por que estudar Direito?

– Sabe que foi uma opção bendita na época que eu fui estudar. Aqui no Piauí não existia Universidade, só havia Faculdade de Direito, Faculdade de Letras e Faculdade de Odontologia. Como meus irmãos já faziam faculdade em Fortaleza-CE, meu pai achou que eu tinha que ir para lá. Saí daqui pensando em fazer economia porque eu tinha feito um curso de contadora. Naquela época, tinha um orientador para conversar com a gente antes de fazer a matricula. Ele disse: “Minha filha, você pode escolher a faculdade na área humana.” Eu escolhi Direito. Na minha família não tinha pessoas formadas em Direito. Depois mandei uma carta para o meu pai, pensando que ele não fosse entender, porque eu saí daqui dizendo que ia fazer economia, uma faculdade que não existia aqui. Quando eu fiz a carta, meu pai fez outra belíssima - ele escrevia muito bem-, ele disse: “Minha filha, hoje eu me realizo através de você e se eu tivesse tido a oportunidade de me formar, queria ter me formado em Direito”. Eu me empolguei, sendo que gosto muito da profissão, vesti a camisa realmente, desde a Faculdade eu dizia que iria ser Juíza.

A senhora saiu da Faculdade e depois ?

– Eu saí da Faculdade em 1976 e em 1977 teve o concurso. Em 1978 eu assumi em uma comarca bem distante, a 426km da capital, sendo que naquela época não tinha telefone, televisão, não tinha nada. E para você falar com a minha família e o tribunal, tinha que fretar um carro do meu bolso. Uma distância de 61km para um posto telefônico, sendo que 61km de ida e 61km de volta. Mas nada disso me fez desistir. Era uma vontade de ser juíza e até aqui estou, com 34 anos nessa luta.



Como foi para a senhora trabalhar como juíza no interior?

– Eu morava na comarca. Participava das missas - sou católica -, participava das procissões, vivia na comarca e era respeitada por todo mundo. Atendia as partes. Eu nunca fui de andar nas casas porque no interior tem um problema, lá quem não é de um lado é do outro. Então, eu não frequentava casas de político, para não dizerem que eu era do lado X.

A senhora não gosta de política?

– Não é que eu não goste. A imagem que se passa de um magistrado muito ligado com a política é de parcialidade e juiz tem que ser imparcial. Às vezes não basta apenas ser, tem que parecer. Porque as pessoas confundem. O Juiz não é diferente de ninguém, mas ele deve ter um comportamento diferenciado.

O que a Senhora não tolera no ser humano?

– Eu acho que é a irresponsabilidade, falta de ética, falta de respeito com o próximo. Sou uma pessoa que valoriza o ser. Eu não valorizo o ter. Por exemplo, gosto do meu trabalho de julgar, não gosto do que o povo pensa que os outros gostam, o glamour.

A senhora frequenta festas ou é muito reservada?

– Sim, saio com a minha família. Mas fui obrigada a ser reservada.

Desembargadora, qual é a sua prioridade no Poder Judiciário do Piauí? O que a senhora quer deixar registrado?

– Quero deixar registrada a construção dos Fóruns, equipá-los e aumentar o número de servidores. Já estamos em 150, previsão de acordo com o nosso orçamento. E mais: fazer curso de capacitação e estimular os servidores.

– Desembargadora, última pergunta, a senhora tem defeitos?

– Eu acredito que eu deva ter, mas procuro podar ao máximo para fazer tudo correto. Não sou um ser perfeito, todo o ser humano tem seu defeito, às vezes fico irritada quando eu vejo as pessoas sem empolgação. Não gosto da falta de ética. Isso me irrita.

Ao final da conversa todos estávamos descontraídos.Desembargadora Eulália é uma mulher forte e de pulso, gostei muito dela . Ela adora cantar, e é uma pessoa muito simpática, quase teve um momento de “canto-musical”. Tudo muito bom!Harmonioso!
Agradeço os seus juízes auxiliares (Virgílio Martins Filho) e a querida e competente jornalista Virgínia Fabris.

Tudo foi leve e espontâneo, isso me deixou muito feliz. Meus agradecimentos...
Meu obrigada especial para Des. EULÁLIA MARIA RIBEIRO GONÇALVES NASCIMENTO PINHEIRO.
A Dama das Flores,A Dama da Voz,A Dama da Justiça!



Obrigada as Mulheres! As Marias e não Marias!

Maria/ Milton Nascimento:Maria,Maria é um dom, uma certa magia /Uma força que nos alerta/Uma mulher que merece/Viver e amar/Como outra qualquer/Do planeta Maria, Maria/É o som, é a cor, é o suor/É a dose mais forte e lenta/De uma gente que ri/Quando deve chorar/E não vive, apenas aguenta/Mas é preciso ter força/É preciso ter raça/É preciso ter gana sempre/Quem traz no corpo a marca/Maria, Maria/Mistura a dor e a alegria/Mas é preciso ter manha/É preciso ter graça/É preciso ter sonho sempre/Quem traz na pele essa marca/Possui a estranha mania/De ter fé na vida.
FAÇA PARTE DA HISTORIA, MULHER!
 
 

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