Mais uma noticia encontrada no site português  DN O GLOBO e que discute proibições em Universidades. Tema recorrente depois da expulsão da estudante da UNIBAN
Al-Azhar: universidade onde é proibido proibir

por Luís Naves01 Novembro 2009

Segundo afirma Abdel-Samine Abul-Khein não há sinais de radicalização na Universidade Al-Azhar, no Cairo, e as histórias sobre esse tema são obviamente exageradas. Reitor da faculdade de justiça islâmica, Abul-Khein é homem pequeno e pesado, além de uma das figuras mais influentes da universidade mais famosa do mundo árabe. A escola tem 1100 anos e 120 mil alunos em diversos graus de ensino (também o médio). Muitos destes estudantes escolhem estudos islâmicos, mas as autoridades pedagógicas afirmam que isso não implica maiores dificuldades em arranjar emprego. Citam até estatísticas para provar que o curso de engenharia é bem mais incerto.
Sejam bem-vindos às contradições do Egipto. Apesar de ser um dos homens mais poderosos da Al-Azhar, Abul-Khein não fala inglês, língua de que não necessita, pois é um especialista em sharia. Nesta universidade, os estudos islâmicos convivem com ciências exactas. Ao lado da reitoria, está a mesquita mais importante do Cairo, sede de doutrina sunita respeitada em todo o Islão. Segundo explicação do professor de linguística Hassan Hafih, Al-Azhar (nome da mesquita e da universidade) é uma palavra antiga relacionada com a ideia de clareza.
Mas por aqui nem tudo é claro. Há muitas estudantes que se vestem com niqab negro, roupa que tapa por completo o corpo feminino e a própria cara. As mulheres parecem fantasmas sem identidade, de quem só se vêm os olhos. É difícil afirmar se isto representa um sinal de conflito, mas tornou-se num problema sério, com repercussões em todo o mundo árabe, quando os grandes clérigos do Cairo, sobretudo o xeque Muhammad Tantawi, se pronunciaram contra o uso do niqab em certas aulas. Vestir à ocidental, usar barba, bater com a cabeça no chão durante as rezas, todos os gestos e roupas podem ser afirmações ideológicas. Mas o código de conduta feminino é uma autêntica bomba política.
Quando recentemente falou com um grupo de jornalistas europeus, Abdel-Samine Abul-Khein tentou fazer passar uma ideia: segundo disse o jurista, a imagem do Islão é "distorcida no exterior". O dirigente da Al-Azhar acredita naquilo a que chama "a estrada intermédia do Islão moderado", em oposição ao "Islão político". Um pouco mais à frente na conversa, o reitor da faculdade alargou-se na explicação: "O Governo não está acima das críticas, até o presidente [Hosni Mubarak]. Nós criticamos e dizemos o que queremos, mas o governante deve ter autoridade. É muito importante respeitar a autoridade".
O professor da sharia falava de Mubarak e de um governo que no ocidente é visto sobretudo como autoritário. Mas talvez falasse de si próprio também. O Egipto não está imune ao crescimento do Islão político, que nos países não muçulmanos é definido como "radical".
Há vários movimentos fundamentalistas, o mais importante dos quais, a Irmandade Muçulmana, tem sido duramente reprimido pelas autoridades. Dezenas de activistas estão presos (sem críticas dos governos europeus) e as poucas mesquitas onde os irmãos muçulmanos estão activos são vigiadas pela polícia.
A corrente regular da doutrina sunita é representada por clérigos como o ex-Grande Mufti do Cairo, xeque Muhammad Tantawi, cuja autoridade religiosa está ligada ao prestígio da Al-Azhar, mas também ao poder do governo. Em meados de Outubro Tantawi visitava uma escola secundária da Al-Azhar quando viu uma jovem estudante de niqab (numa aula onde só havia alunas e a professora era mulher). Tantawi terá dito à rapariga, de 12 anos, para descobrir a cabeça. Decisões governamentais anteriores tinham criado polémicas semelhantes no Egipto, por exemplo, a proibição de uso de véu por enfermeiras.
Mas a ordem de Tantawi transformou-se numa decisão da universidade Al-Azhar, que proibiu o uso da niqab nos dormitórios femininos e nas aulas. Houve protestos e os clérigos dividiram-se. Para alguns dirigentes, é necessário impedir os fundamentalistas de obrigarem as mulheres a usar aquela roupa. Para os opositores, tudo tem a ver com a liberdade de consciência. "Nenhuma autoridade tem o direito de ordenar a uma mulher que retire [o niqab], excepto por razões de segurança", dizia o xeque Ali Abu al-Hassan, outra autoridade sunita, citado pela Al-Jazeera.
A polémica da Al-Azhar interessou a todo o mundo árabe, onde o Egipto é visto como uma referência cultural e política. A proibição mantém-se na universidade, mas os dirigentes não querem forçar um tema que tem todos os condimentos para aumentar o forte descontentamento político-religioso que alastra nas sociedades muçulmanas. Existe uma pressão no Egipto, uma acumulação de frustrações que não pode ser tapada por uma roupa escura que cobre todo o corpo menos os olhos.

Fonte: http://dn.sapo.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=1407099&seccao=M%E9dio%20Oriente

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